sábado, 8 de outubro de 2016

O dia em que Leo Fressato juntou uns cacos de mim...

Há exato um mês vivi um show que me fez ser enxurrada, oceano, tempestade em copo d'água. Chorei como sempre sei que choro, mas ainda duvido que seja capaz de tanto. Chorei como se não houvesse amanhã e como, de fato, não há. Não pra um amor que ficou no ontem, pra onde não se volta, não se olha, não se pode ser. Chorei por ter uma boa memória ruim e por, ainda assim, acreditar no amor.


Conheci Leo há uns três anos, mais ou menos, mas o reencontrei, com mais força, depois, em tardes de cafés no intervalo do trabalho, ouvindo-o junto a Ana Larousse, fazendo um par tão bonito que resolveu - e precisava - ficar (em mim). As parcerias dos dois me acompanhavam agora - além dos cafés - os sonos, as filosofias de janelas de ônibus, os pores-de-sol. E o amor. Sempre e com mais força, o amor.

Ano passado, dividindo com Fressato a mesma cidade pra se morar - bem lá onde o povo chora o dia inteiro - fui a um show dele. Atrasada, perdida, meio enrolada. Não o vi, não o ouvi. Emburrei, quis chorar, mas naquela mesma noite acabei contando pela milésima vez uma das minhas histórias de amor preferida, então passou. Passou... Incrível como o tempo não só passa (e como é ridículo ficar repetindo isso), mas como finda, de algum jeito, escolhendo o que leva e o que deixa. Quase dez meses depois daquela noite de desencontro, tendo voltado pro meu sertão, pude encontrá-lo. Não sem antes ter me quebrado, em mil pedaços, riscando o mapa, desatando os laços e já não mais dividindo a lona e o picadeiro. Abracei Leo sem Ana, eu quase sem viço, com tanto de mim sem saber direito.

Tremi como naquela noite já natalina de 2015. Esperei, quis botar o coração numa caixinha. Cheguei atrasada. A primeira sessão do show, a qual eu tinha pego ingresso, já tinha começado. Sentei na porta do teatro e fiquei ouvindo. Já comecei a chorar, ali, o primeiro parágrafo. Senti saudade, a mesma vontade de voltar quando dei as costas no aeroporto. Senti saudade, aquela falta que a benção materna faz. Cantei baixinho como cantam os passarinhos que já aprenderam muito sobre os riscos, por entre as maravilhas, de voar. Recebi colo até ficar de pé pra segunda sessão. Consegui entrar. Não sei com que pernas, não sei como eu cabia em mim de tão derramada. E lá dentro, tudo era azul.

(essas duas fotos são de Paulo Rossi que também postou em seu blog sobre esse show lindo. Clica aqui pra tu ver.

Leo é um artista incrível. Múltiplo, gigante, contínuo. Melhor do que eu pude, um dia, imaginar. Curitibano com coração Caririense, me arrisco a ousadia da definição. Desbravou o teatro no meio da galera e já chegou parafraseando filosofias de outrora: "Ninguém vê dois shows iguais de Leo Fressato". Brincou com vozes e corpos. Apresentou músicas do novo disco que está por vir e declarou seu encanto pelos casais e pelos chorões que vão aos seus shows. Ensinou pros desentendidos alguns dialetos do universo gay e estendeu um tapete arco-íris pra todo mundo passar. O mundo inteiro coube naquele teatro. Nas cadeiras, em pé nos corredores, no chão. O mundo inteiro cantou em uníssono as canções para o inverno passar depressa e encantou-se, inteiro, com as novas canções, as histórias de amor que lhe foram vida e inspiração, a sensualidade, a paixão, a chuva no ser-tão daquele palco. O palco que uniu dois extremos do país, juntando vozes e sons do sul e do nordeste em "Não há nada mais lindo". O palco que foi testemunha de um espetáculo de entrega, de resistência, de ousadia, de poesia, de verdade e, desculpem-me ser tão repetitiva, mas, também, inevitavelmente, de amor. O show terminou com "Oração" que, tem quem chame de hit mas, pra mim, é uma espécie de mantra. Pra aliviar o peso dos dias, das horas. Leo desceu do palco e pulou com a galera, juntou todos numa só voz, num abraço coletivo. Duvido alguém ter saído daquele teatro com a mesma energia que entrou. 




Eu que sou toda coração e é só assim que sei ser, até ali estava aos cacos. Então naquela noite, cada canção serviu de bandagem e muito do que doía, sarou. Eu estava certa do que sentia e tive mais certeza em palavras. "Leo, tu juntou um monte de caco aqui dentro". Ele sorriu. Dividimos um abraço. Tempo depois, tão nosso, na mesma mesa de bar, compartilhei um pouco da minha saga de cruzar o mapa por (um) amor. "Tu é doida!?". Sou. Assim como era amor independente do lugar. Ainda que a flexão do verbo questione.

Leo me abraçou, fez rir com estetísticas sexuais sul-nordeste, prometeu voltar, juntou meus cacos. Mas aí no dia seguinte eu pensava naquele azul e doía; Lembrava cada detalhe daquele show e me esvaía em lágrimas; De algum jeito bem estranho, eu me sentia vazia. Vai ver deixar ir é, primeiro, esvaziar-se. Vai ver o amor toma conta de mais partes de nós do que podemos supor e quando ele precisa sair, quase nos leva. Vai ver não dá pra arrumar o amor no corpo como se arruma um quarto - bagunçando primeiro pra ter dimensão do trabalho - e é preciso limpar de uma vez, mesmo que a gente ache que tem se preparado aos poucos. Ou vai ver a verdade é que, mesmo sem saber direito, Mainha tinha razão num dos seus clichês mais repetidos, usado tantas vezes de forma vã, mas, talvez, lá no fundo, pra nos proteger: amor não enche bucho de ninguém

Eu esvaziei.
Pra recomeçar.

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